Thursday, December 1, 2016

13.

Fazendo a apresentação teatral de “O pagador de promessas” foi uma ótima experiência para mim. Primeiramente, eu não tenho muito experiência com teatro, então foi como se fosse um novo mundo. Foi mais fácil do que achava, decorar minhas linhas. (Foi muito, muito, muito mais fácil do que decorar o soneto.) Algo que gostei foi a oportunidade de ser outra pessoa, pois sempre gosto de fazer brincadeiras assim com meus amigos. Fazendo isso não como brincadeira, mas como produção, foi uma outra experiência e eu gostei muito.

Uma coisa interessante foi ver a interpretação de todas os grupos de cada personagem. Alguns grupos tinham a ideia maravilhosa de usar mulheres reais para interpretar Rosa. Imagina, né? Uma outra coisa interessante foi ver as cruzes construídas por cada grupo. Achava-me o cara por ter pensado na ideia de usar tubos de papel de embrulhar, mas então vi as outras cruzes e fui um pouco humilhado.

Assistindo hoje o filme, tive a experiência legal de saber muitas das linhas antes de elas serem ditas, e também predizer quais seriam as cenas passando na tela. Isso é algo que não fiz antes, pelo menos, não me lembro de ter feito isso, especialmente com um filme que jamais assisti. Foi interessante comparar minha interpretação de Zé na cena com Zé-do-filme na mesma cena. Também reparei algumas diferenças entra as linhas que dizemos na sala e as linhas do filme. (Isso não é porque decoramos erradamente, mas porque haviam diferenças mesmo.)


Talvez devo ser ator mesmo... 

Thursday, November 17, 2016

12.

“Zé: Moço, eu vim só pagar uma promessa. A Santa me conhece, não precisava trazer carteira de identidade. ”

A natureza e caráter dos personagens na peça podem ser disputados pelos leitores. No caso do Zé-do-Burro, pode ser dito que a morte dele foi sua própria culpa. Pode ser dito que foi a culpa dos guardas e secretas que não o ajudaram. Mas independentemente de qualquer coisa, esta declaração simples do Zé mostra um esforço do autor em tocar o coração do leitor.

Em sua confrontação com as autoridades, Zé mostra uma natureza ingênua que contrasta fortemente com o sarcasmo e cinismo deles. Primeiramente, observa-se a maneira em que ele chama o delegado de “Moço”, como se fosse um amigo, conhecido, ou vizinho amigável. Em seguido é sua declaração de proposito: “eu vim só pagar uma promessa. ” Ele fala como se uma explicação resolveria tudo. Obviamente ele não entendia a natureza de burocracia. Por fim, sua declaração religiosa mostra uma confiança na fé do delegado – uma confiança que, olhando para trás, ele não deveria ter tido.

A maneira que ele é tratado pelas autoridades deixa a cena mais aguda. Rudeza e outras formas de mal tratamento sempre tocam mais os corações de outras pessoas quando são respondidas com inocência. O fato do Zé ser morto logo depois deixa os acontecimentos mais trágicos ainda nos olhos do leitor.


A lição real aqui, na verdade, é difícil perceber. O fato é que há várias lições que podem ser aprendidas aqui. A própria natureza de teatro e outras formas de literatura deixa o leitor aprender o que quer aprender. Uma lição que eu aprendi é: nunca carregue uma cruz até uma igreja para salvar um burro. 

Thursday, November 10, 2016

11.

“ (Contorce-se num ritus de dor. Despe uma das mangas do paletó).
Acho que os meus ombros estão em carne viva. ”

Aqui se mostram, bem no início, uma parte importante do caráter do Zé. A sue fidelidade à promessa que fez é mostrado em umas maneiras, a mais óbvia sendo sua disciplina em carregar a cruz gigante e pesada. Uma das maneiras mais sutis e como ele está vestido. Diz que ele estava de paletó. Existem várias maneiras porque alguém não ia querer carregar a cruz de paletó – para não estragar a roupa; para não ficar desconfortável, não podendo mexer os braços, para não ficar com muito calor, e devem existir mais.

Sua devoção é magnificada aqui pela justaposição do paletó, um símbolo de estilo e apresentação social, contra os ombros, que “estão em carne viva”. Alguém pode imaginar o tecido lindo e preto de um paletó, pensando em como é bonito e estiloso, e então compara a imagem com a de um ombro em carne viva, sangrento, vermelho e feio. O Zé é dedicado mesmo.


A lição? Carregue sua cruz em jaqueta de calça jeans. 

Thursday, November 3, 2016

10.

""Mísera! tivesse eu aquela enorme, aquela / Claridade imortal, que toda a luz resume!""

O poema inteiro é uma representação do descontentamento do homem consigo. Aqui, Machado mostra a ironia deste fato por meio dos desejos tolos da lua, a qual está demonstrando sua inveja do sol. A ironia aqui é tão forte que dá uma certa graça à situação! A lua queria que tivesse a claridade do sol, a “claridade imortal, que toda a luz resume”. O que não vê é que sua luz é um reflexo direto da luz do sol, e que a sua claridade não é simplesmente parecida com a do sol, mas é a própria claridade do sol. São observações como essa que se perdem na inveja e sua polução do juízo. Homens possuídos pelo desejo de algo aparentemente melhor, especialmente quando aquilo parece distante ou difícil de conseguir, muitas vezes deixam de ver que algo em sua posse é parecido, igual, ou melhor que o objeto de seu cobiço. 

Thursday, October 27, 2016

9.

Ó poesia sonhei que fosses tudo”

Que verso estranho... não é que explicitamente diz algo extraordinária ou fora do que é normal ou aceito no geral, mas é que ao refletir, o leitor descobre que realmente é uma declaração um tanto curiosas.

Primeiramente, o narrador está dirigindo suas palavras à poesia. Está falando com um gênero como se fosse um ser distinto. Como se pudesse, de algum jeito, ser recebedor de uma conversa.

Este fato é feito mais significante pelas palavras ditas à poesia. “Sonhei que fosses tudo” – como se ele esperasse que a poesia fosse um salvador, uma cura milagrosa por alguma dor da alma. Sonhou que a poesia fosse mais do que é – apenas uma coleção de palavras em bocas, papeis, livros...

O desapontamento talvez seja exacerbado pelo descobrimento que a poesia se compõe apenas do que há em nossos corações, cabeças e mentes. Quem foi que sonhou que a poesia fosse esse milagre, certo dia, teve que enfrentar o simples fato que a poesia não é nada além de nós mesmos. A poesia não necessariamente tem qualquer poder para nos salvar que nós mesmos não temos.

Também chama atenção a palavra “sonhei”, em contrasto com a palavra “sonhava”. Esta diferença alude ao fato que esta petição à graça da poesia possa ter sido apenas um instante de esperança, mas nada além de uma picada. Ele não sonhava da poesia, mas apenas sonhou. Pensamos então qual seria a situação tão triste e desesperado que alguém precisaria clamar à poesia. Deve ser extremamente triste.


Ó poesia, sonhei que fosses tudo? Poderá ser, só se eu for mais que tudo.

Thursday, October 20, 2016

8.

É querer estar preso por vontade; / É servir a quem vence, o vencedor”

Em analisar estes pequenos versos, é primeiramente necessário reconhecer o fato que Camões é um dos maiores poetas da língua portuguesa, e qualquer desentendimento de suas obras obviamente é uma falha em nossas capacidades de analisar, e não em suas capacidades de escrever e criar. Ele nadou com uma mão, salvando suas obras de uma morte marítima com a outra. O homem merece respeito.

Tendo dito isso, podemos então fazer uma tentativa a ver o que é que ele estava descrevendo. Começamos com sua primeira declaração – querer estar preso por vontade. Há nisso um certo elemento de paradoxo – certamente alguém não está preso se entra por vontade. Mas não é necessariamente a entrada que é feita de acordo com nossa vontade, pois muitas vezes caímos em amor mesmo sem querer. Quando isso acontece, queremos ficar com aquela pessoa, queremos mesmo ser dela – não queremos mais sair. Ficamos contentes em não ter mais a opção de ver outras – ficamos assim presos. Mas é isso que queremos desta pessoa amada. E assim queremos estar presos – entrando sem querer, não querendo nem sair nem ter a opção de sair.

Mas piora! O homem não se contenta com a vida presa – não, seria tão fácil assim. O homem quer vencer – coração, amor, sentimento, emoção – e depois se abaixar em serviço ao derroto. O homem em si é um paradoxo – quer fazer tudo para a pessoa que imagina fazendo tudo por ele. É auto abusivo – faz tudo, tudo, tudo mesmo, para esta pessoa sem promessa nem oferta de recompensa. Quer vencer e se fazer escravo, se for necessário. Quer servir. Quer estar preso. E para que?


Ah, sim... agora lembro. Eu faria igual.

Thursday, October 13, 2016

7.

“Pego de um pau. Esforços faço. Chego
A tocá-lo. ”

Esta frase não teria tanta importância, se fosse literal. Apesar da natureza pouco incomum da circunstância, não há nada de extraordinária em pegar de um pau e tocar um morcego invasivo. Não há nada de extraordinária mesmo.

Mas este soneto não é literal. Descobrimos pouco depois que o morcego é apenas uma representação da consciência humana.

...ou será que é mesmo? Pois é dito, “A Consciência Humana é este morcego! ”, mas não se revela, se esta é observação ou comparação. Supomos que é comparação. Tem um sentido filosófico, e o autor explica como o morcego que vê no quarto também é como a consciência humana.

Mas supomos então que não há morcego nenhum no quarto dele. Isso então nos faz pensar no significado do pau. Qual é o pau com o qual alguém toca a sua própria consciência?

Talvez o pau seja a racionalização. Com ela, alguém bate na consciência até que não incomode mais.

Talvez seja a negação, com a qual alguém retira todas as armas de poder que a consciência possui.

Talvez seja a depressão, a qual ponto se perde o sentir e a consciência nem faz mais diferença.


Então olhe duas vezes antes de decidir o que é real e o que é apenas representação. Nunca se sabe quando é preciso o pau de madeira, e quando é preciso o pau de emoção.